sexta-feira, 10 de abril de 2009

- a fé solúvel;

Entenda que falarei de fé como um observador fala de algo que não tem. O que eu quero dizer aqui não tem nada a ver com igreja ou religião; eu quero falar do coração das pessoas, da capacidade de acreditar que elas têm, e de como isso me fascina.
Eu não acredito em Deus. Não acredito que tudo que vai, volta. Não acredito na justiça automática do mundo; não consigo olhar para uma pessoa que me fez um mal enorme e pensar que um dia ela vai sofrer o que eu sofri. Acredito que a única justiça que existe é aquela feita por nós, que por um sinal não é nem um pouco justa.
Eu cresci numa miscelânea de religiões. Minha mãe acredita em tudo; meu pai em nada, só em Deus. Eles nunca tentaram me influenciar, decidiram que eu tomasse meu próprio caminho, só me falaram de suas crenças de forma imparcial. Então, à medida que eu crescia e ouvia o que as outras pessoas tinham a me dizer, eu decidia em que acreditar. Escolhia, e dizia a mim mesma "é assim". Mas sempre existiu aquela vozinha no fundo da minha consciência, que me convencia de que Deus existir seria bom demais para ser verdade. Confortante demais.
Foi assim até o dia em que eu decidi deixar que minhas teorias inconscientes se manifestassem. Eu imaginei, na minha cabeça, se todos pensassem que Deus não existia e acreditassem que nós apenas ficamos inteligentes demais, sensíveis demais, e que consequentemente precisamos acreditar que alguma coisa a mais existe. Alguma coisa que dê sentido a isso tudo. Se todo mundo pensasse assim, qual seria o maior medo das pessoas?
Pensei na morte, então. Por que se Deus não existe, se ele for apenas um fruto de conforto, depois da morte não existiria nada. Nem céu nem inferno. Pura inconsciência, para sempre. E se todos acreditassem nisso, a morte nunca seria considerada uma aventura seguinte, seria apenas um ponto final. Do que as pessoas precisariam, então? Qual seria o desejo mais profundo da maioria das pessoas? Talvez, que a morte fosse mais fácil, que fosse só um caminho desconhecido. E daí para a existência de Deus, é um pequeno passo. Não seria bom que todo o mal que alguém causasse na terra fosse pago depois que a pessoa morresse?
A minha conclusão final foi que Deus é só isso, uma resposta para os nossos medos mais íntimos, mais irracionais. E eu acho que tomei essa conclusão justamente por ser racional demais, espiritual de menos. Percebi que sempre acreditei nisso, no nada, desde o começo; nunca tinha parado para pensar. Mas isso não me faz uma pessoa corajosa, acreditar que depois da morte não tem nada, por que desde que eu descobri no que realmente acreditava eu tento desesperadamente desmentir a mim mesma.
Deixando minha ausência de fé de lado, comecei a observar as pessoas à minha volta. Tanta gente que dita suas crenças, tanta gente que as guarda para si. E em muitas eu reconheci um medo enorme de morrer que as fazia acreditar, pessoas dotadas de uma fé solúvel, impura, que era apenas fruto de um desejo inconsciente. Mas, contrariando todas as expectativas, em algumas pessoas eu vi apenas... fé. Toda a fé que eu busco o tempo todo, numa pessoa só. Uma fé tão simples, tão verdadeira, incontestável. É dessa fé que eu falo como admiradora. Para tê-la é preciso tanta coragem e sinceridade consigo mesmo, tanto amor ao que quer que for que chamam o seu Deus..
Não que eu classifique as pessoas em Com fé ou Sem fé. Há muitas pessoas que eu conheço muito bem e não saberia aonde colocar; e essa classificação me seria inútil. E se me perguntar se Deus realmente existe, eu direi que acho que não, mas não tenho certeza. Porque tem uma parte de mim que quer que ele exista, uma parte que é tão infestada de medo e insegurança que às vezes me domina, Deus tem que existir, tem que existir. Na verdade, tem horas que eu penso, tanto faz, tanto fez; o que tiver que ser, será, mesmo que eu não estiver pronta para o que vier...

2 comentários:

  1. É incrível como somos complexos, como somos um nada e um tudo gigante. Os nossos sentimentos falam mais alto que qualquer coisa, porque até envolvendo Deus, vem a insegurança. E olha, eu concordei com você em vários pontos do texto.

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