sábado, 27 de dezembro de 2008

- toc, toc, toc;

Dois anos. Eu me lembro como se fosse hoje.
O vento frio subia a rua, desafiando a gravidade e me refrescando da temperatura quente do dia. Eu estava chegando em casa da padaria, um doce enorme debaixo do braço, e nada poderia me fazer menos feliz. O natal fora lindo e completo, e logo o ano novo ia começar; uma ótima notícia para quem ama novidades. Me lembro de estar ansiosa para chegar em casa, e de olhar para o céu e ver que o Sol começava a descer, dando a tudo um tom alaranjado.
Não é como nos filmes; nunca confie em Hollywood ou Steven Spielberg. Eu queria que algo pudesse mostrar tudo que se passa na cabeça de uma pessoa quando acontece algo do tipo. Quem sabe assim alguém entenderia.
Não há músicas de suspense, nem qualquer desconfiança; a pessoa não faz a mínima idéia do que vai acontecer. Pelo menos no meu caso, a rua não estava deserta, um casal vinha no sentido contrário, rindo e brincando de empurrar um ao outro. Me lembro de sorrir, associando a cena a uma de minhas melhores memórias. E, quando eu passei pela esquina, me lembro de olhar para o outro lado e vê-lo ali.
Nos filmes, o terror que se sente é muito menor do que esse. A surpresa é avassaladora, e o medo vem tão forte que você perde o equilíbrio. Não, ninguém entenderia.
Me lembro de chegar em casa aquela noite, meia hora depois, sem o mínimo apetite. Eu deixei o doce na cozinha e fui para o meu quarto. Felizmente não tinha ninguém em casa para me ouvir enquanto eu me desfazia no banheiro. Me lembro de ir até a janela, e de escorregar até o chão ao ver que ele ainda estava ali.

(ninguém pergunta sobre esse texto, ok?)

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

- tanto faz, tanto fez;

Os dias têm passado rápido.
Eu percebi isso quando vim olhar aqui e vi que já fazem nove dias desde que eu postei; foi como um piscar de olhos. Me faltou inspiração, ultimamente. Acho que é por que eu tenho passado tanto tempo lendo que não me sobra tempo para escrever.
De qualquer forma, outra coisa na qual eu reparei quando pensei em como os dias passam rápido por essas férias, é que as horas parecem transcorrer muito mais lentamente quando ele está comigo. E que em todo o tempo que ele não está, eu faço tudo correr para vê-lo novamente.
Eu nunca fui muito boa em fazer tudo correr; o tempo sempre me desobedeceu, transformando cada minuto em uma hora quando eu estava ansiosa. Mas essa capacidade de ignorar o relógio me veio tão naturalmente que eu mal percebi; fazia tanto tempo que eu não sentia paz, nem por um minuto. Passei um longo momento pensando no que isso significava. E decidi que não precisava pensar, que realmente pouco importava o motivo ou as consequências; ele me trazia paz, apenas por sua presença contínua e carinhosa perto de mim. Tal fato já era suficiente para justificar um vício.
Vício. Palavra forte. Mas não há definição melhor para a necessidade constante que eu tenho de tê-lo em meus braços. Eu tento não pensar muito nisso, pois, por mais que eu me contrarie, esse sentimento me parece uma regressão. Vício parece algo muito grotesco e desumano quando se compara com o amor. E, por incrível que pareça, eu fui muito bem sucedida nesse negócio todo de não-pensar. Já faz muito tempo que as dúvidas antigas que me atormentavam se silenciaram com uma tranquilidade estranha e amarrada ao alívio: tanto faz.
Tanto faz que tanta coisa esteja errada na minha vida, tanto faz que eu precise resolver tantos problemas. Deixa isso para depois. Eu estou de férias, tenho um sol novo e lindo para me iluminar, e foda-se o mundo. Vou deixar uma única ansiedade me atormentar: a de tê-lo comigo novamente, aliviando minhas dores, saciando minha vontade de afeto. Pouco me importa que isso seja errado, seja usá-lo; ele sente tanto amor por mim como eu por ele. O fato de não precisar me preocupar é, de várias formas, estimulante.
Então, por mais que descobrir o quanto o tempo está passando rápido tenha me surpreendido, eu prefiro que seja assim. O futuro é uma das tantas coisas que me amedronta, e tudo que me dá medo precisa acabar rápido. Eu não quero que fique melhor do que isso, para que depois não fique pior. Deixa estar, deixa. Eu estou bem assim. E eu quero que isso continue, por mais que estar bem pareça algo muito grotesco e desumano quando se compara com estar feliz.

domingo, 14 de dezembro de 2008

- caminho;

Por um momento, nada mais importa. Ao fechar os olhos, me excluo da frieza de mais um dia vulgarmente nu que começava a nascer.
Eu queria gritar para o mundo quanto amor eu tenho para oferecer. Queria que de alguma forma todos soubessem que ali, naquele corpo miúdo de criança, há amores que moveriam montanhas procurando, ávidos, por um encaixe. Em meus devaneios inocentes, eu crio o meu próprio mundo; longe de decepções e infestado de cores vívidas. No meu mundo, o amor seria colorido. No meu mundo, eu conseguiria ter certeza de que ele realmente existe; e saberia quando eu encontrasse alguém capaz de amar de verdade.
Por mais que sejam só devaneios, o alívio pela ausência da dúvida consegue ser real por um segundo.
Seria tudo mais fácil se o amor fosse algo tangível. Eu poderia abraçá-lo, envolvê-lo entre minhas mãos e plantá-lo como semente no meu jardim. E, quando ele não fosse mais necessário, eu o enterraria junto com o passado, em algum lugar onde ele jamais floresceria; não causaria dor, nem me faria imaginar coisas tão estúpidas sobre algo que eu não sei nem se existe de verdade.
Mas nem a tranquilidade dos meus sonhos me liberta da realidade; ela perfura minhas barreiras e inunda tudo como ferro líquido, pesada e prestes a se firmar de forma incorrigível. Meu mundo se mancha com histórias de pessoas que deram seu amor, agora física e possivelmente domável, e nunca mais o reaveram nem ganharam outro amor para substituir. Não importa com que forma eu o imagine, as pessoas nunca deixam de ser corruptíveis, e sempre têm uma forma de violá-lo.
Diante disso, minha única opção é abrir os olhos, deixar os sonhos para trás, e tentar pensar logicamente. Se o amor existir, seria ele uma entidade consciente? Me aterrorizo com a possibilidade; qual seria o interesse em causar tanta dor às pessoas? Não, reconheço minha natureza covarde ao me recusar a considerá-la. O interesse vêm do desinteresse, naturalmente. A dor resulta do abraço do amor e da indiferença. Então, como preveni-la?
Espero pacientemente meus pensamentos se livrarem do aperto forte da dor e das lembranças. Como eu poderia prever tudo isso, e, dessa forma, não precisar buscar por algum tipo de alívio? Se antes, eu soubesse como tudo acabaria, eu poderia simplesmente pular essa parte da minha vida e fingir que ela nunca teria existido? Ou eu viveria o extremo da felicidade novamente, interpretando sinais de que o fim estava próximo, esperando pacientemente a dor me envolver com seus abraços pungentes?
Tantas perguntas, nenhuma resposta. Entre a lógica e os sonhos, não vejo nenhum caminho viável. Tento uni-las, entrando em contradição. Tento não seguir nenhuma das duas, e o caminho que me resta é mais tortuoso do que qualquer outra coisa; eu não deixaria a dor me dominar novamente a ponto de se tornar algo separado, e constante. Então, suspiro. Hora de me levantar para um novo dia. Quem sabe amanhã, eu decidiria meu caminho.

(duas noites de insônia seguidas causam pensamentos demais, e pensamentos demais causam um texto desses.)

domingo, 7 de dezembro de 2008

- pulso;

Ah, pungiu me como ferro à pele o negro pulsante daqueles olhos sombrios. Três segundos se passaram e eu soube que me marcaria pra vida inteira como uma sábia cicatriz. Uma mão de aço envolveu minha mente e tudo girou. Fraquejei.
Ah, me dê mais três segundos e eu volto ao normal. Está tudo bem, eu consigo respirar. São apenas alguns devaneios antigos, sabe, vieram à tona, imagine, assim do nada! Eu posso me levantar, só me dê a sua mão, sim?
Ah, que cheiro doce. Sua camisa recém-lavada roçando em meu rosto, hum, não me coloque no chão ainda, eu quero respirar por aqui mais um pouco. Por trás de meus olhos fechados eu ainda podia vê-las; duas bolas negras brilhantes, pulsando, agora seguramente distantes de mim.
Ah, mas não vá para longe, não. Não por enquanto. Ainda posso sentir o arder da cicatriz, feroz como a descoberta; você irá para longe, mas não agora, por favor. Não pare de afagar meus cabelos, não pare de sussurrar preocupações inerentes ao meu ouvido. Não ainda.
Ah, era tudo que eu queria, mais um instante que fosse com seu sorriso caloroso e seus olhos amargos de fel. Obrigada por voltar nesse segundo. Está tudo bem, eu estou feliz agora, estamos juntos novamente. Você não sabe o quanto eu esperei para..
Ah, bom dia, um novo dia. Bom dia para o Sol que desce entre as persianas da minha janela e aquece meu rosto molhado pelas lágrimas. Bom dia para mais um dia infestado de pensamentos sobre mais um sonho que eu cansei de rejeitar.
Ah, se eu fechar os olhos agora, será que poderei sentir seu cheiro doce, ou ouvir sua voz? A mão de aço agora aperta minhas entranhas, instigando, mordendo; seus olhos ainda pulsam em meu peito, sua cicatriz ainda arde em minhas veias.
Ah, desisto. Me levanto da cama, forço a mão de aço a se redimir, ela voltará. Quase pude senti-lo dessa vez. Desisto.

sábado, 6 de dezembro de 2008

- o infinito entre duas escolhas;

O Sol brilhava forte no topo do céu. Ela contemplou o mar aberto à sua frente, sentindo-se parte daquele misto de verde e azul brincando pelo horizonte. Ser tão pequena e insignificante perto das milhares de vidas que se estendiam à sua volta trazia uma confortável sensação de anonimato. Colocou as mãos no rosto, respirando devagar; o calor já secara suas lágrimas. Depois de toda tempestade, vem a calmaria.
A tranquilidade era o momento que ela mais temia. Não que gostasse de se sentir desesperada; ela apenas odiava a falsa paz que sentia depois que as lágrimas secavam. Era o momento em que tudo parecia parar; o tempo, as águas, o vento; tudo estagnado numa harmonia irônica de acordo com os seus sentimentos. O silêncio pesava tão forte que ela mal podia ouvir a própria respiração; seu coração parecia bater preguiçosamente, no mesmo ritmo vagaroso que ela absorvia da paisagem. E, com o silêncio, os pensamentos fluíam; ela desistiu de tentar contê-los e entregou-se, voraz, em busca de conforto.
Um instante depois, arrependeu-se da falta de cautela.
Ao abrir sua mente para si mesma, as lembranças há tanto tempo guardadas cegaram seus olhos. Todos os momentos que ela forçara a permanecerem escondidos de seus sonhos e desejos reivindicaram seus devidos lugares; e, com eles, veio a saudade, imensa, avassaladora. O amor que sentia, somado à ausência que lutava para ignorar, ganhou força, inundando seu corpo como água fervendo, fazendo com que ela se encolhesse e arfasse. As lágrimas não vieram de novo, com suas promessas enganadoras de alívio. Devagar, sentindo os segundos como se fossem uma vida inteira, ela colocou cada sentimento maravilhoso e cruel num canto de seu coração que passava quase despercebido. E, cerrando os dentes, trancou-os de sua mente junto com todas as lembranças.
Percebeu que fechara os olhos involuntariamente. Voltou a olhar o mar, deixando que sua mente vagasse, mais controlada dessa vez.
Coração e mente. Duas entidades separadas.
Por toda a sua vida ela usara a razão para controlar o que sentia. Não deixava que seu coração fizesse o que bem entendesse de suas atitudes e intenções; reprimia-se cada vez que ele rumava para caminhos perigosos. Vigiava com os pensamentos, bem de perto, cada afeição ou desgosto que sentia; no intento de não fazer idiotices ou iludir-se por amor. Agora, o tempo em que mantinha esse controle parecia ter acontecido num outro século.
Reconheceu o amor verdadeiro assim que ele começou a nascer, alimentando-se de suas forças. Ele parecia tão bonito e sincero que não o reprimiu. Deixou que ele envolvesse seus sonhos, suas ações; mal percebeu quando ele abraçava sua mente, dominando-a; trazendo-a para perto de seu coração, unindo os dois como se nunca, nem por um segundo, eles tivessem vivido separados. O amor trouxe a esperança a tiracolo; a certeza de que nunca estaria sozinha a dominou, e foi em sua função que ela passou a escolher seu caminho. E, em todo esse processo, ela foi a mulher mais feliz do mundo.
Mal percebeu quando o tempo passava e sua felicidade se tornava sua própria armadilha. E, quando tentou se livrar do laço que unia seu coração e sua mente, não o encontrou; eles agora eram um só. E o amor que ela sentia impregnou-se em tudo que fazia, tudo que pensava; ela podia vê-lo em cada gesto; uma marca de afeição e dor. A esperança se fora, e a certeza mais importante de sua vida quebrou-se como vidro; cortando, sangrando por dentro. E, com o tempo, ela foi tomada pela dúvida.
Ao pensar em todos os momentos felizes que viveu, ela sentia a esperança tola confortá-la por alguns instantes. Então seu coração traiçoeiro guiava sua mente até o presente, e ela não podia acreditar que conseguiria sentir amor e ser feliz ao mesmo tempo.
Ali, à beira do infinito, ela pensou, por muito tempo, em qual parte de si deveria acreditar; passado ou presente, amor ou descrença. Mas, quando o Sol já se recolhia e as estrelas começavam a surgir, ela ainda não sabia aonde para onde olhar.
Levantou-se e caminhou em direção à rodovia. Ao chegar na estrada, uma nova palavra formou-se em sua mente: futuro.

(texto feito pra minha irmã, a Anna Banana que eu amo tanto. eu pensei muito no que escrever; mas eu não conseguiria fazer um texto pensando nela que não falasse de amor verdadeiro. então, que ela leia a sua própria história, e encare o final como uma dica da sua irmã mais velha: pra onde olhar.)

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

- sol de inverno;

A insônia me roubava mais algumas horas de tranquilidade. Eu não queria acordar pra esse dia.
Por trás dos olhos fechados, eu lutava contra as imagens que começavam a surgir na minha mente. De alguma forma, saber que tudo aquilo aconteceu há exatamente um ano atrás me obrigava a lembrar cada detalhe que eu tentava excluir da minha memória.
Eu vi, e quase pude sentir, o nosso primeiro beijo; exatamente há um ano atrás.
Me encolhi na cama. Há alguns meses eu choraria, e sentiria a dor me invadir, inevitável como sempre; mas o tempo passou e adormeceu as feridas mais fortes. Agora, a dor era como o frio; trazia consigo a mesma pele arrepiada, os mesmos abraços em volta de si, e o mesmo incômodo constante, porém suportável. Tremi. Era como se o gelo abraçasse meu corpo de dentro pra fora, como se a única forma de eu me aquecer de novo fossem aqueles braços em volta de mim.
Forcei meus pensamentos a irem embora. Eu precisaria de muita força de vontade pra sobreviver àquele dia.
Minha mente vagou por várias inutilidades até parar em um certo rosto. Quase sorri. Depois de tanto tempo em um inverno congelante, ele havia surgido em minha vida como um Sol no céu nublado. O meu Sol de inverno; daqueles que não aquecem completamente, mas trazem consigo um dourado fosco que anima o ambiente. Eu já havia me acostumado a ficar mergulhada no frio e no escuro, tanto que quase não reparava neles; o alívio que me inundou ao perceber sua ausência se tornou um vício. Automaticamente, ao visualizar aquele rosto em meio aos meus pensamentos, eu senti um calor confortável e relaxei os músculos. Me perguntei, pela milésima vez, o que eu sentia pelo meu Sol de inverno.
Abri meus olhos e olhei no relógio. Ainda era cedo.
Decidi me atormentar com essa pergunta sem resposta mais tarde. Concentrando-me, quase sem sucesso, em não me lembrar de todas as palavras e gestos que eu sentira há um ano atrás, fechei os olhos. Tentei me livrar da preocupação de que essa tática não funcionaria por muito tempo; ao longo daquele dia eu me encolheria periodicamente, procurando me aquecer; mas não consegui.
Então, deixando que o Sol aquecesse meu coração, me entreguei a sonhos mais seguros.

(esse texto eu escrevi sobre ontem, dia 3.)

domingo, 30 de novembro de 2008

- sem limites;

A cena era a seguinte: cinco amigas, um ônibus, uma puta paisagem, e uma viagem pra contar.
Eu era uma delas. Por um momento, me ergui acima das conversas, entrando num estupor agradável que me permitia reviver os momentos mágicos do final de semana. Encostei a cabeça no vidro da janela e pensei em cada riso, cada besteira, cada pequeno instante da viagem; deixei que minha mente divagasse.
O céu era daquele azul que só se vê em filmes, até uma faixa de nuvem; abaixo dela, era perceptível uma mancha de poluição ao longe; pra onde eu não queria voltar. A fumaça misturava-se com as nuvens de algodão, formando milhares de espirais, e eu poderia passar o resto da minha vida ali, só olhando, ouvindo ao fundo o som daquelas que me trazem mais felicidade do que qualquer outra coisa. Um pequeno sorriso involuntário brotou dos meus lábios.
Perto do horizonte, um avião se distinguiu da fumaça. Da janela, ele era menor do que uma mosca. Me surpreendi ao perceber que ali deviam estar mais pessoas do que no ônibus em que eu estava.. e me senti inundada pela grandeza do mundo. Parei pra pensar, e me toquei que há tanta coisa para decidir, tantas opiniões pra formar e histórias para ouvir; e me encolhi, por perceber a minúscula fração que eu sou do universo e a mudança menor ainda que aconteceria se eu deixasse de existir.
Assustada, fechei a cortina. E me virei para olhar o que eu tinha pela frente.
As quatro melhores amigas do mundo sorriram para mim. Do outro lado do ônibus, o sol começava a descer no horizonte. E senti que meu amor preencheria o mundo.

sábado, 22 de novembro de 2008

- uma pequena analogia;

O jovem moço deitou sob a relva e abraçou os joelhos. Deitado, ali mesmo, corria. Temia que a dor chegasse primeiro.
Fechou os olhos. Ignorou o frio da chuva e do vento, e começou a lembrar.
Voltou ao primeiro dia, àquela mão branca e fina que parecia leve o suficiente pra que o vento a levasse. Lembrou-se do quanto sonhou antes de poder finalmente roçar sua pele naquelas mãos de cristal. Quase pôde sentir o cheiro doce de seu cabelo, sempre preso ao coque de bailarina gracioso; percorreu os olhos sobre seu corpo de menina e de moça, os traços ínfimos que cansou de memorizar, a cada dia, a cada minuto que passava entorpecido pela sua existência quase tangível. A água em sua boca se confundiu com o gosto daqueles lábios finos e delicados; involuntariamente, estendeu as mãos, procurando, esperando.. manteve-se alheio ao barulho das gotas de água esparramando-se à sua volta, e ali, debaixo da chuva, sob o frio do vento, quase pôde ouvir a sua voz.
Não distraiu-se nem quando um trovão rugiu ao longe.
Correram por aí, no tempo que se seguia, histórias incertas sobre aquele moço, jovem moço, que dormira forçando seu coração a bater, e que ele assim estaria, por mais que desabasse o mundo.. Muitos foram vê-lo, contra várias doenças foi medicado, por muito tempo foi presenteado com visitas dos mais variados tipos de religião. Mas o tempo apagou as lembranças, hoje já esquecido, ele dorme, por mais que desabe o mundo.
Ele dorme e sonha, sorri e chora, e sussurra para si mesmo as notas da música que outrora ela dançava, com seus pés de moça e sorriso de criança. Há quem diga que ele espere, outros já desistiram de confabular. Mas há quem saiba que ele só teme a dor que sentirá ao acordar, e o futuro incerto que o espera ao desistir de evitá-la. Há quem saiba, que por mais que ele corra, um dia ele perderá a luta; quando seus pés não puderem mais aguentar. Cai a chuva, passa o vento.. E ele continua dormindo.

(Hoje eu percebi, o porque de tanta falta de inspiração; e eu percebi também que estava na minha cara o tempo todo.
Cada sentimento descrito por mim sempre procura a definição perfeita; como explicar completamente meu estado de espírito, mesmo que de forma indireta. Eu nunca consigo isso, mas eu sempre tenho uma pequena idéia daonde eu quero chegar.. do que eu preciso tirar de mim, pra que pare de me atormentar; ou da felicidade que eu desejo mostrar pro mundo. E, ultimamente, nenhuma palavra parecia ser completa e intensa o suficiente.
Por que eu não sabia, não entendia, o que me atormentava.. do que eu estava precisando, qual o alívio que eu buscava com tanta ansiedade. Eu já havia desistido. Até que eu baixei a canção de ninar que o Edward fez pra Bella (que vai tocar no filme), ouvi, e chorei. É uma composição só de piano, linda, mas que normalmente não faria as pessoas chorarem. E eu chorei..
E eu percebi que não eram as palavras que estavam tão incompletas.. era eu mesma.
Eu sou o maior exemplo que eu conheço de fraqueza, de dependência, e de medo. Eu já senti muita dor. E o medo de sentir isso de novo afasta de mim tudo que eu amo, todas as pessoas que me dão esperança; isso suga as minhas forças, me desidrata, por que eu dependo irremediavelmente dessas pessoas; da certeza e da incerteza que elas me dão ao mesmo tempo. Eu percebi, hoje, que eu estou procurando às cegas por algum pedaço de mim que eu deixei por aí. E que essa busca sem direção acaba com toda a alegria que eu consigo reunir, como água resvalando por entre os meus dedos..
Ah, da forma mais idiota possível, eu percebi que eu quero um amor com todas as minhas forças.. eu quero um abraço forte, que me proteja e me aqueça; eu quero um olhar que traduza devoção, compromisso; eu quero que isso dure até não poder mais, que seja real, não apenas nos meus sonhos. Eu não quero mais acabar com tudo e viver com migalhas por aí. Eu preciso de algo muito maior do que isso.
E agora, só me resta não deixar mais que esse aperto no estômago constante me atrapalhe quando eu for escrever.. por que eu sei, eu me conheço; amar não é mais tão fácil pra mim, e não é tão cedo que isso vai acontecer.
Essa é só uma explicação do por que de tanta ausência daqui. E tomara que eu volte a escrever, logo.)

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

- péssimo novembro;

Eu queria voltar a escrever.
Não sei que porra me fez parar de escrever. Tá, eu fui escrever um depoimento de aniversário pra uma amiga minha e.. não saiu. UM DEPOIMENTO. Agora me explica como é que tanta inspiração some do nada, e como todos os seus textos de repente viram um lixo..
Eu tenho dezesseis arquivos enormes do word cheios de textos (a maioria eu não mostro pra ninguém), sem contar os blocos de notas e os perdidos por aí. E então, do nada, toda a capacidade que eu tinha de me esvair em palavras some, e eu fico desesperada de tanta sensação martelando na minha cabeça pedindo pra sair. Que merda. Isso devia ter uma fórmula, sabe?
Esse incômodo não sai da minha cabeça, o dia todo. Eu fui mal na prova de redação (isso era inédito até essa última prova..), acabei com todas as minhas idéias, e não consigo fazer uma porra de post decente sobre não conseguir escrever. Eu achei que era por que eu não lia faz tempo, então eu engoli toda a série do Crepúsculo em menos de uma semana e esperei a inspiração vir. Eu andei na rua sozinha uma tarde quase inteira e fiz capuccino numa caneca vermelha linda que eu tenho e que me dá idéias. E nada funciona!
Eu vou enlouquecer em poucos dias; tô em processo, contagem regressiva, há!
Alguém aí que entenda de mentes estranhas explodindo de tanta informação, que tal me dar uma ajudinha?

domingo, 9 de novembro de 2008

- aos seus pés;

Chorei ao me deparar com o amor
E o ar se rendeu à minha falta de fôlego
Por carecer te deixar, foi a dor
E a lembrança de seu desejo trôpego

E o beijo cativou meu devaneio
Desandei, e aos seus pés virei criança
A inocência se mostrou como um espelho
E o pudor que a perfídia sempre alcança

Mas não por mim o seu olho brilhou
E não a mim foi destinado o seu apego
Enquanto o anseio ardente atenuou
A vã espera me revolvia ao gelo

Em um sonho feito pelos meus desejos
Eu te levarei ao inferno
E o fogo será a nossa única testemunha

Não haverá perdão aos nossos erros
Seguiremos um rumo incerto
Que em nós livremente se expunha

(eu não consigo mais escrever, então eu coloco um texto mais velhinho aqui. eu gosto desse poema por causa desse negócio de vou te levar ao inferno, muahaha. mas, por favor, alguém me ensina a trazer a inspiração de volta?)

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

- capítulo um;

Sarah vislumbrava o mar aberto à sua frente. Ele parecia pronto para abraçá-la, e ela suprimia a vontade de jogar-se a ele, ínfima, em meio às ondas imponentes; apenas uma peça simplória daquela imensidão. A praia calma reduzia-se a uma linha rosada e distante, à medida que a canoa de madeira se afastava rumo ao norte. O remo pesado afrontava as águas, impulsionando a canoa para frente. Sarah permanecia de pé, equilibrada, os olhos semicerrados pelo sol, mirando o horizonte, uma linha contínua azul-marinho, interrompida apenas pelo vulto de uma ilha.
Seu pequeno corpo vibrava de ansiedade. Apesar de seus dezesseis anos, sua aparência tapeava as pessoas; o rosto infantil e o corpo não desenvolvido contradiziam sua mente amadurecida. A pele morena, marcada pelo Sol, parecia ter brilho próprio; os cabelos desgrenhados presos num coque baixo enalteciam seu rosto quadrado e seus lábios robustos.
A ilha parecia mais próxima agora. Sarah sabia que a aparente proximidade era enganadora, e que demoraria muito ainda para chegar em seu destino; permanecia despreocupada, planejara e estudara por muitos anos essa pequena travessia. Não ia se desesperar agora.
Contrastando com a suavidade das águas contornando o remo, um obstáculo chamou a atenção de Sarah. O instrumento colidira com algo resistente e preso à areia; mesmo tão distante da maré, a praia era famosa por isso, sua profundidade ia aumentando vagarosamente, tanto que Sarah quase que poderia alcançar o chão se pulasse. Fincou o remo na areia para que a canoa parasse. Olhou para os dois lados, examinou o fundo, atenta. Então, despiu-se.
Sua roupa de fibra leve e rica seria inútil e incômoda nas águas. Por baixo, roupas velhas e escolhidas para a necessidade de entrar na água. De súbito, mergulhou habilmente no mar, e a água lambeu carinhosamente seus cabelos; aos poucos o corpo ajustava-se à temperatura fria; ela não sentia dificuldade em abrir completamente os olhos. Dirigiu-se sem pressa ao obstáculo, segurando a respiração sem dificuldade. Apenas um pedaço era visível; a maior parte da caixa de madeira escura estava soterrada. Sarah tirou uma pequena lâmina que trazia amarrada à cintura, pôs-se a cavar rapidamente; com um grande esforço pôde retirar a caixa inteira. Voltou à superfície, a caixa segura em suas mãos, surpreendentemente leve. Subiu na canoa e procurou por um fecho na face frontal da caixa, decorada habilmente com flores e arranjos. Não havia nenhum.
Esquecera de seu objetivo, ansiosa para examinar a caixa; esquecera que não dispunha de muito tempo. Logo, vozes masculinas fizeram-se ouvir; e, ao olhar à sua volta, percebeu o que a curiosidade lhe custara: mais uma tentativa perdida.Cinco barcos com três homens cada um a rodeavam, e um deles já havia amarrado uma corda ligando seu barco à canoa de Sarah. Não fizeram perguntas, Sarah já sabia o que faziam ali. Suspirou, frustrada, e resistiu ao impulso de lançar aquela caixa ao mar. A canoa foi puxada pelo barco, não para o norte, não para o seu destino; mas de volta à sua simplória existência na praia.

*
Jad sucumbiu ao choro. Seu rosto já marcado pelo tempo contraiu-se; suas mãos enrugadas tremeram, seus olhos miúdos molharam a face. Ela olhou para o marido, desesperada.
- Mandou todos os seus homens?
- Mandei – a voz dele revelava impaciência.
- Mandou procurarem em direção à ilha?
Apenas um murmúrio de afirmação como resposta; marcado pela frieza desumana que se via em seus olhos. Nenhuma palavra de carinho ou consolo, apenas sua presença insípida; irredutível.
- Acha que vão encontrá-la, Marcel? – disse Jad entre soluços, ávida por uma palavra de esperança.
Um suspiro cansado. Nenhuma emoção.
- O mar é grande.
- E se ela chegar na ilha? E se ela encontrar... – Jad parecia aterrorizada em pensar na hipótese.
- Chega, Jad – não era um pedido, tampouco algo para tranqüilizá-la; ele apenas desejava que ela parasse de perturbá-lo.
- ... o que será de nós, meu Deus? – ela pareceu não ouvi-lo.
Marcel chutou o pequeno banco de madeira à sua frente. Seus olhos incharam de fúria incontida.
- Cale a boca! – ela olhou para ele como se acabasse de perceber que ele estava ali. Suas lágrimas rolaram sozinhas. Levantou-se.
- Você se tornou mais frio e duro que uma pedra de gelo. Um monstro. Atroz como aqueles homens que tanto desprezava na guerra! – ela saiu sem olhar para trás, o corpo curvado pela velhice e sacudido pelo que restou de seus soluços. Marcel arfava. Suas mãos grossas permaneciam contraídas, mas seus olhos já não demonstravam nenhuma emoção.
Na sala contígua, Jad sentava na mesinha de centro, e rezava por perdão a um Deus que não acreditava mais; apenas pela carência de expor suas lamúrias. E pedia, sem fé, mais a si mesma do que a alguma divindade; que Sarah não chegasse àquela ilha.

*
Sarah desvencilhou-se do aperto do soldado no braço. Ele mantinha-se próximo demais às suas costas, e ela sentia seu cheiro podre de fumo e sua risada maliciosa. Ele a conduzia até a porta do lugar onde menos desejava estar; sua casa.
A mansão branca brilhava ao Sol que já descia no céu. O estábulo enorme do outro lado do lago não se comparava à monumental construção à sua frente, antiga mas renovada; em ótimo estado. Ao avistar a velha senhora correndo em direção à Sarah, o soldado se afastou. Jad abraçou a filha com fervor, mas ela ignorou o abraço; continuou impassível agarrada à caixa já seca pelo Sol.
Jad conduziu a filha ao seu quarto, e a deixou sozinha. Sarah deitou-se em sua cama, frustrada; enfiou a caixa na gaveta de sua penteadeira e suspirou. Podia até contar os segundos que faltavam. A porta se abriu com estrondo. Seu pai, cheirando a uísque e tomado pela fúria, avançou para ela com uma cinta na mão.

*
Naquela noite, Sarah não dormiu. Suas pernas ainda ardiam com a surra que levara no final da tarde. A Lua já ia alta no céu, mas seus olhos bem abertos examinavam a caixa à sua frente. Fechada. Nenhum cadeado. Apenas uma tampa pregada à caixa tão fortemente que nenhuma fresta lhe era perceptível. As cabeças dos pregos afundados na madeira estavam enferrujadas, e Sarah perdera horas limpando todo o limo que encobria a caixa.
Vasculhou suas coisas, mas não encontrou nada que pudesse abrir o pequeno baú; desceu pé ante pé as escadas cobertas de veludo vermelho, e saiu pela porta dos fundos da cozinha; sem fazer o menor ruído, a caixa aninhada em seus braços frios.
Respirou o ar fresco da noite. Sentiu a grama roçar seus pés descalços, ouviu o murmúrio incessante dos grilos; pressentiu o cheiro de jasmins. Aproximou-se do lago, que lhe parecia um grande espelho imóvel, reverenciando a Lua; o contornou, em direção ao estábulo. Distinguiu, no escuro, o vulto da oficina de seu pai, contígua à construção de madeira clara.O estabelecimento cheirava a mofo. Sarah prendeu a respiração enquanto acendia o pequeno lampião pendurado na porta encostada; entrou silenciosa na oficina, em busca de alguma ferramenta útil. Não teria coragem de serrar a caixa, precisava de um pé-de-cabra ou algo parecido... abriu inúmeras caixas de ferramentas situadas nas prateleiras atrás do balcão, mas não encontrou nada que servisse. Desanimada, abriu um armário encostado entre a porta e o canto da parede; seu rosto brilhou de alegria ao encontrar um grande pedaço de ferro moldado exatamente como precisava; apoiou a caixa cuidadosamente no balcão e pegou o ferro com as duas mãos. Precisaria de muita força. Pegou um serrote no meio da sessão de marcenaria, abriu uma pequena fresta onde pudesse encaixar o ferro. Colocou a caixa no chão, posicionou-se, e encaixou a ponta do pé-de-cabra na fresta aberta pelo serrote. Pressionou para baixo, apoiando todo o seu peso. A caixa rangeu.
Pressionou de novo. Sentiu a tampa levantar um pouco.
Respirou fundo, tirou os cabelos suados do rosto. Pressionou mais uma vez.
A tampa da caixa voou, foi parar atrás do balcão, fazendo estardalhaço. Sarah agarrou a caixa e correu atrás da tampa, ágil; seus passos leves estavam acostumados com a noite. Em alguns minutos, estava de volta ao quarto, a caixa aberta sobre as mãos pequenas.
Sentou-se em sua cama, feliz por finalmente poder ver seu conteúdo. Ao vislumbrar uma pilha de papéis amarelados completamente preenchidos por palavras, a lápis, desapontou-se. Folheou-os, e leu a primeira folha.

“Ela será fruto de uma história de amor.
Será morena, bonita, com lábios carnudos e cabelos presos.
Participará de vários tipos de misticismo, mas nunca acreditará em nenhum deles.
Saberá se comportar diante dos outros, mas terá medo da intimidade.
Será egoísta, e seu orgulho será um mártir.
Mentirá, e suas mentiras a aprisionarão.
Seus arrependimentos serão seus castigos.
Sofrerá, mas também será feliz.
Presenciará desgraças, mas nunca se tornará uma pessoa amarga.
Terá uma vida marcada por segredos.
Temerá a morte, e todos os desconhecidos.
Terá piedade, ansiedade e nunca conhecerá a paz.
Demorará a conhecer o amor, e quando o conhecer, não saberá usá-lo.
Será criada sob o gelo, mas nunca perderá a esperança.
Amará a magia, as histórias infantis e o sol.
Aprenderá a muito custo que nem todas as histórias têm um fim concreto, a maioria se perde no começo de outra.
O passado será o seu maior inimigo.
Escolherá a ignorância à ciência das verdades terríveis.
Verá tempestades em garoas, chorará lágrimas inúteis.
Sorrirá de verdade pela primeira vez aos dezessete anos.
Desafiará o destino.
Morrerá tarde demais.”

Uma assinatura marcava o final daquela profecia, legível e simples.

”Marise”.

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

- prefácio;

“O silêncio é uma obra divina”, pensou Marise. Seus olhos fechados escondiam asatisfação estampada em seu rosto. O frio, o escuro; as reflexões fluíam como água; o instante. O cheiro perdido no ar limpo. A sintonia.
Abriu os olhos. Vislumbrou o papel em branco à sua frente. O que viria agora?
Pôs-se a escrever. A sua mão morena voava de um lado para o outro, mas sua caligrafia permanecia inalterada pela pressa; uma idéia se sobrepondo à outra, frases interrompidas, palavras riscadas. A ponta do lápis roçando o papel, o pó do grafite manchando suas mãos; podia descrever tudo com detalhes, cada sensação descrita em sinestesia, podia sentir tudo.
A história surgia inconstante, um embrulho disforme de informações jogadas, com um único sentido implícito, perceptível, embora inconscientemente. O exílio acarretava um sentido contrário do esperado, a paz e todas as suas conseqüências. Marise o procurava em todos os momentos do dia, obtendo apenas aqueles instantes em seu quarto. Breves, e densos. Muito breves.
O sorriso se formara em seu rosto. Já estava na hora de desmanchá-lo.
- Marise! – a porta se abriu de súbito.
O lápis caiu no chão, a folha incompleta, uma palavra na metade. Marise sentiu o gosto da raiva na boca.
- O que foi?
O rosto da freira não demonstrava maior satisfação.
- Espero que essa folha não seja o que eu penso.
- A senhora pensa?
- Basta de suas grosserias, Marise! Dê-me o papel!
Marise sabia que seria inútil insistir. Sua mão tremia quando entregou a folha a Irmã Sofia.
- E da próxima vez que você perder a missa escrevendo essas baboseiras imorais...
Ela pareceu engolir o resto da frase. Saiu, batendo a porta, não sem antes pegar o lápis do chão e guardá-lo no bolso de suas vestes.

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

- quarenta e três anos!

Eu larguei a televisão e o sofá, ignorei os protestos do meu corpo cansado, e vim aqui. Apesar da minha promessa de que iria dormir o dia todo hoje, uma história se formava na minha cabeça, e eu precisava começá-la. Eu abri o Word, pois estava tão inspirada que seria capaz de escrever duzentas páginas tão rápido quanto minhas mãos permitissem.
"E agora, o que está acontecendo comigo?"
Foi como se eu tentasse segurar água com as minhas mãos (peço desculpas pela metáfora poética, mas eu acabei de ler um livro sobre uma fantasia épica e estou impregnada). A história, a inspiração, tudo passou como se alguém tivesse apagado tudo da minha mente. Tudo se foi, menos a vontade de escrever.
Tá, sem dramas. Eu nunca tive dificuldade em escrever. Sempre que eu pensava, eu escrevia; eu formulo frases sobre meu cotidiano ao longo de cada dia, na minha cabeça. É tudo uma coisa só. E, como eu ainda não perdi a minha capacidade de pensar, alguma coisa estava errada, certo? Bom, o que importa é que eu já tinha até esquecido a minha história e estava absoluta e completamente frustrada. E eu odeio ficar frustrada, porra. É como se você pudesse ver um rio de idéias pra começar, e todas elas estivessem fora do seu alcance. Você pensa, parece bonito, e quando você escreve parece infantil. Diabos!
Aí eu liguei pro meu pai; digamos, que ele escreve monstruosamente bem (eu ainda posto algum texto dele aqui), e que é meio que a minha inspiração personificada. Hoje é o aniversário dele, e eu liguei pra ele pra perguntar o que estava acontecendo comigo (eu sou mesmo uma filha desnaturada). E ele me disse assim (não, eu não vou esquecer isso nunca): "Você perde as suas histórias por que não acredita que elas sejam realmente boas. Agora para de frescura e vai lá, escreve o que você tá pensando, pra depois você mostrar pro seu pai aqui que se orgulha de você".
Eu acho que essa história é uma daquelas muito fáceis de adivinhar o final.
E ah, eu pensei em fazer uma homenagem pra ele aqui, e então eu pensei que não haveria homenagem melhor do que essa; a maior fonte de admiração que eu tenho dele. E ah, a história? Não vou mostrar pra ninguém por enquanto. Mas está ficando grande.

(parabéns pai *-*)

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

- quarto 336;

George pegou algumas flores na floricultura da esquina e arrumou a gravata cinco vezes. Pegou uma colônia barata no porta-luvas e ensopou o pescoço. O cabelo bem arrumado não combinava com seus olhos cansados e precisando de sono, fato que ele constatou com uma rápida olhada no retrovisor. Animado pela proximidade da visita, ligou o carro.
Não usava o carro antigo já havia anos. O escort vermelho forte chamava a atenção das pessoas na rua não só por sua cor elétrica, mas também pela grande quantidade de fumaça que produzia e pelo barulho ensurdecedor que se alastrava por vários quarteirões. George bufou, satisfeito. Estava tudo perfeito; o cheiro de naftalina do paletó, a colônia barata, os cabelos puxados de lado, até os olhos cansados de quem acaba de ter um dia duro de trabalho. Ele só esperava que o carro conseguisse chegar até lá.
Dirigiu o mais vagarosamente possível, com os olhos lacrimejantes por causa da fumaça. Já era quase duas e meia da tarde quando inclinou o carro no estacionamento da clínica mais cara da cidade. Checou os sapatos, que já apertavam; impecáveis. Apertou o botão dez do elevador.
Apesar da cor amarelo claro do terno, que normalmente causaria comentários maldosos ignorados por George, ninguém parecia reparar nele. Ele adotara uma postura sorridente e convidativa, e, a cada andar em que o elevador parava, mais pessoas entravam; e nenhuma lhe dirigiu sequer um bom dia. Mas George era forte. Ele não ia desistir agora.
Saiu silenciosamente, de nariz empinado, quando chegou ao décimo andar. Seu olhar passou o primeiro corredor sem o mínimo sinal de reconhecimento, se demorou um pouco mais no segundo, cheio de saudade; e, por fim, ele virou no terceiro corredor à esquerda, apertando os nós dos dedos, tirando uma mecha grisalha do rosto. A diretora da clínica esperava-o na maior sala do corredor.
Ao vê-lo, ela engasgou-se com uma risada. George não levou a sério, risonho, e deu algumas voltas em torno de si mesmo para que ela pudesse apreciá-lo.
- O que seria esse.. figurino? - disse ela, os olhos apertados de divertimento.
- Era sobre isso mesmo que eu gostaria de falar com você, Roberta - disse ele, nem um pouco abalado, parecendo orgulhoso de si mesmo. A um sinal da diretora, sentou-se.
- O estado de Hilda não mudou nem um pouco. O que poderia te trazer aqui além disso? - ela sentou-se e assumiu a expressão mais séria que conseguiu no momento.
- É exatamente sobre o estado dela que eu gostaria de conversar.. Olha, Roberta, ela já está aqui faz três anos e ainda não me reconhece. Eu sei que pode ser até irreversível, mas eu acho que posso ajudá-la. Eu preciso. - ele passou a língua nos lábios secos. Roberta mordeu a língua.
- E vestir-se assim ajudaria Hilda como? - ele odiava a ironia que ela usava ao considerar as suas idéias, que foram tantas ao longo dos anos. Mas George sempre soube compreender, e, ao olhar as pilhas de papéis de cada pessoa que ela ajudava, ele aceitava, e sorria.
- Eu me vesti assim no nosso primeiro encontro. Até a colônia é a mesma, as flores.. a gente estava numa fase de festas estranhas, sabe? E eu acho que talvez, se eu a levasse até o lugar do primeiro encontro, até o carro é aquele antigo sabe, em que nós demos o primeiro beijo..
- Hilda não pode sair da clínica. Ela está sob cuidados médicos. - Roberta tivera um dia difícil.
- Ela está sob cuidados médicos faz três anos! E eu sou a única pessoa que ela não reconhece..
- Não podemos fazer mais nada, George, só esperar.
Ele sentiu-se impotente, fraco. Levantou-se e sua cabeça girou. Engoliu as lágrimas. George era forte.
Dirigiu-se de volta ao segundo corredor. Recompôs-se na frente da porta do quarto 336, olhando para o desenho que sua mulher, Hilda, fizera. Traços de criança. Depois de trinta e dois anos de casados, ela voltara a ser criança em alguns poucos minutos, naquele maldito dia em que a chuva arrastou o carro para um barranco. George escapara ileso. Observou a caligrafia infantil em que ela escrevera "casa" sobre a porta do quarto. Ela mal se lembrava daquele sobrado rosa claro que eles compraram depois de trabalharem em dois empregos cada um por seis meses, onde moraram por quase trinta anos. A clínica cinza, com vidros embaçados que mal deixavam que ela visse a rua, era sua casa agora..
Ele bateu na porta. A enfermeira o convidou a entrar, Hilda estava dormindo. Ela acordou ao ouvi-lo sentar ao seu lado.
- Larry?
- Oi, Hilda. Como você está hoje?
- Ah, eu senti a sua falta, Larry. Você me trouxe flores! - Seu rosto enrugado abriu-se num sorriso iluminado. A enfermeira deixou as flores em um vaso ao lado da cama, e saiu.
- Você está linda hoje, meu amor.. Mas nós não combinamos que você me chamaria de George?
- A enfermeira me disse que você é George hoje, Larry. Mas eu não me lembro de nenhum George. Eu me lembro de Larry.
- Eu sei, meu mel. - George fechou os olhos cansados, e tirou o paletó ridículo. Ela nem percebera.
- Mas sabe que a história que você me contou ontem era muito bonita? Eu não me lembro. Do que mesmo você falava? - seus pequenos olhinhos azuis faiscaram.
- Era a história de um homem que fazia sua mulher apaixonar-se de novo por ele todos os dias. E.. - ele parou. Ela estava com o olhar perdido, evidentemente perdera a atenção. George suspirou, e pegou a mão pequena e branquinha entre as suas.
- Você ficará comigo para sempre, Larry? - ela se aninhou entre seus braços. George a sentiu trêmula, e a apertou forte.
- Eu te amo, minha flor.
- Então você fica comigo esta noite?
- Até que você durma e sonhe comigo.
Não demorou muito, Hilda descansava, aninhada nos braços do seu marido, que, para ela, aparecera apenas três anos antes. George prometeu a ela que não a abandonaria, que faria com que ela o amasse de novo como amou naquele primeiro encontro. Mas ela não estava mais ouvindo.
Ao acordar, algumas horas mais tarde, Hilda sentiu que George não tinha ido embora.
- Você volta amanhã, Ben? - George acordou, sobressaltado.
- Mas é claro. Eu sempre voltarei.


(eu escrevi isso pensando numa frase que ouvi em uma música. "há mais histórias de amor do que o homem pode contar..")

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

- cuidado com o que deseja;

Por que na porra da minha família nada é normal?
Eu andava me perguntando isso ultimamente, e percebi que eu não estava falando de ser normal, estava falando de as coisas serem como nos filmes de drama bobos, os que dão certo no final. Eles realmente conseguem fazer a nossa cabeça.
Bom, mas, de qualquer forma, por que tudo na minha família é tão intenso? Eu sempre fui profunda e sempre gostei disso, mas tem horas em que eu preferia que tudo fosse mais superficial. É muito mais fácil de lidar com as coisas quando é assim. Com as coisas ruins.
Por exemplo, quando alguém te magoa. Nos filmes, esse alguém te pediria desculpas, te daria algum presente, e vocês viveriam felizes para sempre. Nada de ressentimentos. Mas na porra da vida real existem pessoas que quase nunca se machucam, mas, quando isso acontece, não é fácil. É daquelas vezes em que você tem que pensar e pensar em como pedir desculpas, em como fazer tudo voltar ao normal. Nada de draminhas. Merda.
Mas até que a minha história parece uma história de filme.
Eu sempre tentei conquistar o meu irmão. Quer dizer, depois daquela fase em que meninas e meninos não podem se dar bem, e daquela outra em que meu-irmão-nasceu-pra-me-perturbar. Depois disso, nós viramos amigos. Não assim, grudados, tipo best friends forever end éééver, nada de melações. A gente só deu de terminar os respectivos namoros ao mesmo tempo e precisar, e convenhamos que isso é bem diferente de querer, do apoio um do outro.
Ok, eu no início fiquei surpresa por ele ser o cara que estava me fazendo parar de chorar e ficar bem. Mas eu percebi que a diferença de todo mundo pra ele é que ele nunca tentou me dar conselhos naquela hora em que eu estava me empanturrando de chocolate, ouvindo uma música fossa e chorando. Nessas horas, ele só me fazia rir. E eu esquecia. Que menina que quer ouvir falar de seguir em frente quando o namoro que ela tanto esperou simplesmente.. acaba?
É, aquele lá, o menino que sempre me provocou e atiçou todos os meus sensos nervosos, ele me entendia mais do que muita gente. Porra, eu percebi que eu sempre precisei disso, dessa certeza de ele-vai-estar-sempre-mesmo-do-meu-lado. E ah, aí eu comecei a correr atrás.
Por que sim, eu já cometi muitos erros; não que ele também não tenha cometido, é só que quando você quer apagar as coisas do passado é muito mais fácil se você simplesmente corrige os seus defeitos. E espera que a pessoa perceba. Mas ele nunca pareceu perceber. E isso começou a me deixar triste.
Meu irmão nunca disse "eu te amo" pra mim. E eu achava isso um absurdo..
Eu falava pra todas as minhas amigas o quanto eu admirava aquele cara, o quanto eu gostava dele, o quanto a gente ficava bastante junto e ria. Eu coloquei ele em primeiro lugar pra mim. E ah, ele nunca me colocou abertamente no primeiro lugar dele. Ele nunca me contava as coisas dele, por que ele estava triste, quando estava; ou o que ele fez no final de semana. E eu também achava isso um absurdo. Toda vez que a gente brigava, eu chorava e ficava numa bad imensa, e ele tratava tudo como se nada tivesse acontecido. E eu acho que foi por isso que eu comecei a fingir que não ligava também.
E o tempo foi passando, e eu desisti de lutar por uma mínima demonstração aberta de carinho que fosse. Eu voltei a ser aquela menina-que-estava-pouco-se-fodendo-para-o-seu-irmão-chato. Eu só não percebi isso. E, de tanto tentar conquistá-lo, eu nunca percebi que eu já tinha conseguido; até que a minha impaciência fez com que eu o perdesse de vez.
É, sabe aquela sensação de conseguir o que você queria, mas descobrir que não era bem o que você queria?
A gente só brigou, muito e muito, seguidamente. Sem fazer as pazes nos intervalos.
E deu que no final eu estava no meu computador fingindo que não ligava por estar daquele jeito, quando meu pai veio conversar comigo sobre meu irmão estar no quarto dele, chorando, por ter desistido de mim.
Chorando por ter desistido de mim.
Hã? (reação um).
Ah, não.. (reação dois).
Merda. (reação três).
Pensa, assim, no desespero. No arrependimento. Na tristeza. E junta tudo.
Eu estava tão cega por precisar de palavras pra acreditar que ele gostava mesmo de mim, que não reparei nas pequenas demonstrações de amor que eu ganhava todos os dias. Quando ele me chamava pra ver um filme, quando ele me contava o que fez ele rir, quando ele me perguntava o que tinha acontecido pra eu estar chorando daquele jeito, quando a gente passava o jantar inteiro rindo de besteiras que só a gente iria entender.. quando a gente ficava sentado por horas conversando sobre nada que importava. Por que só o fato de conversar era importante.
E eu, que sou tão boa em dar amor e carinho, não soube receber.
Então, eu corri atrás dele por tanto tempo pra conseguir algo que eu já tinha. E para acabar com o que quer que restasse.
E, se a minha família não fosse tão densa, ele poderia me dizer, ok, eu te desculpo Tatah, afinal, você é a porra da minha irmã. E nós riríamos.
Mas não, ele tinha que se machucar, que ficar triste de verdade e desistir de ser meu amigo. Mas que merda, as pessoas que a gente ama não deviam desistir da gente, mesmo quando a gente quase as expulsa da nossa vida. E, por mais que eu vasculhe na minha mente, eu não consigo achar um jeito de me redimir. Por que ele parecia tão triste comigo que eu acho que nada vai ser suficiente; nada vai ser bom o bastante pra ele, nada que eu fizer. O desespero vem disso.
Por isso que eu estou escrevendo aqui; ele nunca vai ler, e ninguém vai achar que eu estou escrevendo isso pra que ele saiba. Essa porra de texto é tão sincera que eu não vou nem relê-la, por mais que ela esteja uma bosta. Eu estou triste. Muito.
Estou triste por ter acabado com tudo, e não saber como fazer pra voltar. Eu queria ter coragem pra ir lá, contar isso pra ele, e pedir desculpas. Eu queria que ele não ficasse com a mágoa que eu sei que ele vai ficar de mim, por que ele sempre fica. A idéia de ele magoado comigo por muito tempo me angustia. Eu queria voltar a merda do tempo e fazer tudo diferente.
Talvez ninguém entenda isso; ele entenderia, se estivesse do meu lado, se fosse com outra pessoa que eu tivesse feito tudo isso. Mas, de todas as pessoas do mundo, ele não merecia. E isso só faz eu me sentir cada vez mais e mais sozinha e perdida; sem saber o que fazer.
Bom, então pra todos que não conhecem o meu irmão, e que certamente nunca falariam isso pra ele, eu sinto muito. E ah, eu amo o meu irmão. E nunca desistiria dele.
Me desculpa.

terça-feira, 7 de outubro de 2008

- um dia tudo vai mudar; (2)

O dia de hoje é quase uma contradição.
Eu acordei sentindo aquela paz e aquela coisinha que perturba a minha paz. Eu amei e odiei sentir aquela sensação de tudo estar acabado. Era pra eu ter chorado muito hoje, lembrado de você e de todas aquelas coisas que me machucam; era pra eu ter pedido abraços o dia todo e não era pra eu conseguir pensar no amanhã. Mas eu quase nem pensei em você. Eu não olhei para o chão pra conter as lágrimas, não perdi o rumo das conversas pra olhar pro céu e procurar a sua lua. Hoje eu senti paz, por tudo finalmente ter mudado; e me incomodei, por ter mudado tanto.
Eu acho que nunca vou me conformar com o jeito como as coisas passam. Por mim eu viveria para sempre as mesmas épocas, experimentaria e analisaria cada detalhe, cada jeito de fazer as coisas, cada rumo que eu poderia dar à minha vida. Eu odeio o jeito como ninguém espera eu decidir que cansei da minha vida desse jeito, antes de revirá-la; odeio a nostalgia que me persegue e talvez sempre perseguirá. Um dia tudo vai mudar, eu sempre digo, pra me convencer que eu consigo mudar, e aceitar que o resto mude, pois ele sempre muda.
E quando eu acordei hoje e percebi que eu não ia me desfilar em lágrimas por você ter me abandonado, eu me senti completa, em paz; e quando eu percebi que sim, a nossa história ganhava um final mais definitivo do que nunca, eu quis voltar. Eu sempre quero voltar.
Por que eu ainda amo você com todas as minhas forças, e eu sinto falta de quando eu podia deixar você tomar conta disso. Eu ainda amo você, mas esse amor não é mais seu. Você não pode mais fazer dele o que quiser. E eu amava deixar que você o dominasse.
Apesar de ser um alívio não chorar hoje, as esperanças morrem junto com as lágrimas, a partir do momento em que aquela parte do meu coração que acordou com o seu amor dorme de novo. E eu sou péssima nesse negócio de perder esperanças. Chegou o dia de tudo mudar, afinal. E eu esperava me sentir de qualquer jeito, menos assim, tão dividida. Mas, por mais que me doa isso de colocar um fim em tudo, se eu pudesse escolher, dessa vez, eu não voltaria. Eu não deixaria o que eu sinto controlar as minhas decisões, eu pensaria no que é melhor pra mim; e eu sei que eu não aguentaria reviver a sua partida mais uma vez, por mais que eu reviva a sua presença mil vezes. E é isso que vai fazer essa minha paz não ruir com o tempo.
E hoje foi quase uma contradição, por que eu não deixei que ela se concluísse. Eu segui em frente, olhei pra trás; mas foi só por um momento.
Agora só me resta olhar pra frente.

sábado, 4 de outubro de 2008

- dessa vez, não.

Eu odeio fases. Elas são tão instáveis quanto eu. Cansam, mudam, vêm e vão, e não perdem permissão a ninguém. Quando eu percebo, eu estacionei e todos foram na frente. 'Ei, voltem aqui, eu ainda não me cansei de vocês', eu digo e ah, eles nunca voltam, e eu sempre fico ali me perguntando qual foi o meu erro. E tudo se torna muito mais cruel com a mania que todos têm em dizer 'pra sempre' o tempo todo; pra sempre isso, pra sempre aquilo, pra sempre ao seu lado; e eu fico pra sempre acreditando num pra sempre que nunca vem. E quando eu percebo, oh, passou, era só uma fase; uma porra de fase. E todos já viraram a esquina e já estão vivendo outros pra sempres de alguns meses de duração, enquanto o meu infinito é barrado por tantas lembranças de fases que eu não esqueci. Fases, fases fases. Eu não quero fases. Eu preciso de alguma coisa um pouco mais eterna do que um 'te amo hoje e sempre, mas só por enquanto tá?'; alguma coisa que dure tempo suficiente pra se tornar inesquecível, mas que não atormente só a mim. Que deixe saudades em todos que me disseram pra sempre. Que seja recíproca, intensa, que não me deixe chorar de saudades; que exista pra sempre na minha vida.

(tô com raiva.)

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

- pra você;

Hoje eu pensei tanto em você que precisei escrever aqui. Eu passei um bom tempo sentada naquela parte do shopping onde a gente costumava tomar sorvete de limão e provocar os seguranças de tanto desobedecê-los. Eu lembro de como você ria quando eles vinham com aquela cara de 'essas crianças' e a gente fingia que não via. E daquela vez que você parou de andar do nada pra dizer que me amava.
Já faz tanto tempo. Na verdade nem eu sei o que me prende tanto ao passado, a você, ao que a gente viveu; eu já tenho muitas experiências a mais pra contar depois disso, já até pensei que podia me apaixonar de novo. Mas quando eu vejo uma foto, ou sonho com os seus braços, parece que todos os meses que eu já vivi depois de você foram tão diminutos que uma lágrima poderia envolvê-los. E descrevê-los.
É como se eu rebobinasse todas as sensações boas e revivesse apenas as ruins; como se eu tivesse passado tanto tempo apoiada no seu amor instantâneo que estivesse escorregando com sua ausência repentina. É como se você tivesse acabado de me dizer que não queria mais.
O desespero é o mesmo.
E nesses momentos eu percebo, como se sempre estivesse óbvio, que cada coisa que eu faço de bonito, ou de triste, desde que você foi embora da minha vida, te chama de volta. Cada lágrima que eu derrubei, por qualquer motivo que fosse, trazia implícito um pedido de socorro; um pedido pelo seu abraço(um daqueles que me lembram o verão). Cada palavra inútil que eu escrevi nesse blog se refere à saudade do teu gosto. É tudo pra você.
E eu queria pelo menos poder colocar todas essas coisas numa caixa, embrulhar com papel de seda(por que ele me lembra o seu sorriso), colocar um laço de fita e te dar de presente. Eu diria, ah, é tudo seu; e eu preciso tirar você da minha vida. Queria que você aceitasse de bom grado, dissesse que o passado foi bom e me desejasse toda a felicidade do mundo. Queria poder te dizer que eu já não choro mais todos os dias; que eu estou conseguindo viver com o meu amor adormecido, sem você pra que eu o pratique.
É uma pena, você não entenderia; eu sei que você não faria esforço nenhum pra entender. Talvez seja idiotice minha todo esse negócio de sorvetes de limão, caixas e lágrimas comuns. Afinal, já faz tanto tempo, e você já superou há tantos meses que eu me sinto uma nostálgica exagerada toda vez que sinto que não estou completa.
Mas, como uma vez alguém me disse, tudo isso que eu já fiz pra você talvez seja uma homenagem bonita demais e sincera demais pra quem nem conhece muito bem o amor. E intensa demais pra ser tão escondida.
Talvez eu esteja exagerando. Mas talvez seja realmente uma pena..

sábado, 27 de setembro de 2008

- antigos;

Máquina:

Punge o fogo
O corpo toca
Um grito sufoca
Na escuridão

Caída na areia
A dor incendeia
E as portas se fecham
O exílio, expressão

Do fogo, da dor
Que punge, que toca
Magnífica engenhoca
É sinal, é razão

(fevereiro 2007)

-
No escuro:

A escuridão da noite a torna mais sombria
Na praia onde me exilo diariamente da sociedade
As ondas quebram indiferentes
Sem nada com que se importar
Pois chegará o dia para clarear tudo novamente
E elas poderão ver a luz outra vez
E finalmente estará tudo bem
Elas me observam sutilmente dentre a espuma
Remoendo minha mente com um pensamento mortificante
Na verdade, sinto-me aflita
Pois chegará o dia para clarear tudo novamente
Mas você não estará mais aqui na minha frente
Pra dizer que me ama e que sou a melhor mulher do mundo
E que não viveria se eu não estivesse aqui
O tempo passa cruelmente a cada minuto
E cada segundo me destrói um pouco mais
Pois chegará o dia para clarear tudo novamente
Mas você não estará mais aqui,
Na minha frente.

(junho 2005)

-
Anseio:

Noite tão bela que rege o luar
Do deleito, remete-me, de ter um alguém
Pois está frio e a lua já está em seu glamour
Restituindo o sofrer que me faz aguardar

Pequena e luzidia estrela do amor
Seu afago envia e me cura da dor
Meu coração, guia, por onde for o tempo
Minha esperança, restitui, reintegra meu sentimento

Noite tão bela que rege o luar
O que tanto venero, traz num doce beijo
Pequena e luzidia estrela do amor
Do contrário, de tristeza, morrerei em teu leito

(fevereiro 2004)(esse tá deprimente né)

-
Mentiras:

Me lembro das coisas que você me dizia
Dos momentos em que me prometeu que nunca iria me deixar
Das palavras de carinho
Do amor que não era amor

Me lembro dos beijos e dos abraços
Das demonstrações de afeto constantes
Das promessas cínicas e cruas de sentimento
Do desejo que era só desejo

Me lembro das deliciosas sensações
Que você adorava provocar
Dos pequenos momentos dóceis e sensíveis
Da amizade que era só amizade

Me lembro que pra mim você era a luz do sol
Antes bela, singela e pura
Intensa e aparentemente eterna
Única e cheia de amor

Que se tornou falsa e frágil
Um foco fraco sem rumo, sem sentido
Sem alguém pra iluminar
Lembranças que me fazem chorar
Pois ao lembrar que era tudo tão perfeito
Lembro que era tudo mentira
E lembro também da luz do Sol
Que se apagou e nunca mais voltou

E que, por certo motivo
Sei que nunca mais voltará.

(agosto 2005)

-
eu tava fuçando na caixinha de coisinhas antiguinhas e achei.
porra, eu evoluí né?

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

- neve;

Eu queria que fosse a paz mais neve que vento
Que lembrasse manjar branco e durasse muito tempo
Para ouvi-la sussurar minhas notas tristes
Presentear meus sonhos com sua certeza em riste

Eu só criei três vezes um mundo em fantasia
Envolto em véus e feras de insípida harmonia
Onde eu pudesse deitar minhas dores e amores
Onde eu pudesse ajustar, recuperar as flores

Os dias frígidos são lembrança do passado em guerra
Tão efêmero e constante que mal posso acompanhar
Como um pedaço de céu que viesse à terra
Pra me provocar, só pra me provocar

Eu queria seus beijos de papel na minha roupa
Eu escreveria mil sonetos, desenharia puro contento
Daria a tranquilidade fina por suas mãos de louça
Por seu amor de mel, ah, só por ele eu tento

(pra fazer esse poema eu pensei: quero fazer um poema branco. minha obra de arte:)

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

- uma noite;

Tutz, tutz, tutz. O ritmo da música penetrava em meus ouvidos, e me dominava; inconscientemente, eu já não estava parada; dançava apaixonadamente impulsionada pelo álcool. A minha única atenção extra estava a uns dois metros de mim; e parece que eu também atraía seu olhar moreno que eu conhecia tão bem. Há tantos anos eu o vira pela última vez. E hoje, ele voltara, junto com vários centímetros a mais e um desejo incontrolável.
Um prazer irreprimível se apossou de mim quando ele se aproximou; e as horas seguintes se passaram de uma só vez.
Me lembro de sua boca roçando meu pescoço, suas mãos percorrendo meu corpo. Me lembro de seus beijos infinitos e do jeito que ele pressionava o seu corpo no meu, mais forte, cada vez mais forte. E de como eu desejava cada vez mais que ele não me largasse nunca. Me entreguei completamente àquela força irrefreável que me dominava, me controlava, fazia de mim puro desejo; de seu toque, ah, eu me lembro do seu toque, seguro, morno, forte, cruel. Esqueci das pessoas à minha volta; algo insignificante se eu não tivesse deixado que tudo fosse além do imaginável. Me uni a ele, me desfacelando em seus braços, o prazer me fazia enlouquecer.
Por incontáveis momentos, depois daquela noite, tentei sentir seu toque em minha mente; tentei lembrar de como sua língua quente dançava com a minha. Pensei nele por vários dias. E por vários dias meu estômago despencava de ânsia por um pouco mais.
Então, o vício era isso.
Quero as suas mãos.
Tutz, tutz, tutz.

(ah, outro desabafo. eu preciso daquelas mãos.)

sábado, 20 de setembro de 2008

- casa grande;

Eu desci as escadas empoeiradas em direção à sala mal iluminada, com cuidado para não perder nenhum detalhe. As janelas antigas emperradas ainda tinham o mesmo vidro que eu quebrara quase trinta anos antes, quando brincava no quintal, e as paredes ainda conservavam um esboço dos meus desenhos antigos. O lustre de ferro estava tão enferrujado que tive medo que caísse sobre mim. Olhei em volta.
Nos tantos anos que passei longe daquela rua, daquela casa, eu me sentia um nostálgico depressivo toda vez que pensava no passado. Nenhuma das casas enormes cheias de modernidades em que morei me traziam a satisfação da infância; eu lembrava das construções brancas com telhados vermelhos, das reuniões na igreja aos domingos, das brincadeiras incontáveis que inventei; e nada conseguia atingir o encanto daquela rua. E fora em busca dessa sensação que eu atravessara tantos quilômetros e chegara ali.
Mas naquele momento eu senti que havia algo errado. Eu buscara por tanto tempo nas lembranças o conforto que havia perdido ao sair dali, e, ao estar de volta, não sentia o mesmo. Me assustei ao me deparar com um espelho: eu vi a repugnância em meus próprios olhos. Era como se não fosse a mesma rua, mas só mais uma vila qualquer da periferia de uma cidade qualquer. Alguma coisa estava faltando; alguma coisa que deixasse aquele lugar tão bonito quanto fora antes.
Saí da casa. Me surpreendi ao lembrar que, já na minha época, as paredes tinham a tinta descascada e a poeira já atingira níveis incontroláveis. Estava tudo igual, e eu não conseguia imaginar o que poderia estar ausente. Decepcionado, estava prestes a voltar ao carro quando o vi.
O tempo o envelhecera, mas ainda tinha as mesmas feições de criança. O menino da casa ao lado. Ele sorria. Senti o passado me chamando, perigoso e tentador. Abri mão de toda a minha barreira contra sentimentos fortes, e me permiti lembrar das noites brincando na rua, do cheiro de café quente, das corridas até a pracinha, do amor que eu sentia por cada morador daquela rua que hoje já não abrigava mais ninguém. O conforto de finalmente sentir de novo me abraçou. E percebi que aquele amor nunca deixou de existir, não pelo lugar, mas por tudo que vivi ali, todas as amizades que contruí, tudo que aprendi com meus amigos; percebi que qualquer lugar poderia ser o meu lar se nós estivéssemos todos juntos.
Olhei em volta, ofegante, e, finalmente, em casa.
A rua estava linda.

(esse texto eu escrevi pro concurso de redacao do diaro do grande abc. tema: amizade na rua. lol
e o outro (arquivo 11) eu queria continuar, mas tenho serios problemas de criatividade sob pressao.)

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

- arquivo 11;

"Um destino um pouco diferente do que imaginavam", pensei, enquanto folheava as páginas de um artigo já amarelado dos arquivos da Biblioteca Municipal. O recorte de jornal falava do destino que os "homens perfeitos" como eu deveriam cumprir; e em quais tiveram êxito e em quais fracassaram. Um grande equívoco; se o destino existe, um suicídio não pode ser considerado um fracasso, apenas algo que deveria acontecer. O homem contraria suas próprias especulações.
Procurei um nome em meio a tantas reportagens da pasta "Arquivo 11" do acervo de notícias da biblioteca. Me deparei com uma foto de Jeremy e a notícia de seu suicídio. Cerrei os dentes. Ele foi a única pessoa que viveu o mesmo que vivi sem deixar-se corrromper pelo poder; e atirou em sua própria cabeça num restaurante em Los Angeles, onde jantava comigo. Eu jamais esquecerei o que ele me disse naquela noite.
- Nathaniel, eu vi o futuro. Eu estive lá. - seus olhos se encheram de lágrimas. - Vai ser horrível.
- Eu estarei contigo, Jem. - eu só pude balbuciar.
- Sinto muito, mas eu não. - foram suas últimas palavras.
Meus pensamentos foram interrompidos pela foto de um homem de feições iraquianas que eu não reconheci. A legenda dizia "Saiyd foi o idealizador do projeto Arquivo 11, que acelerava em milênios a adaptação humana. O projeto vai além de adaptações físicas como perda de pêlos ou dentes; abrange uma evolução cerebral de mais de 50%..." Eu sabia a história de cor.
Uma semana depois, aquele rosto, um pouco mais velho, estava na minha frente, sob a mira de uma arma controlada por minhas mãos. Eu não atiraria sem dizer a ele o quando ele fizera mal.
- Você matou Jeremy.
- Não foi a minha intenção. - ele estava calmo, calmo demais.
- O homem perfeito.. você queria criar um homem perfeito, evoluindo sua inteligência e adaptação. Mas a perfeição vai muito além disso! Você evoluiu a imperfeição ao alongar o medo, a raiva e a ambição das pessoas que submeteu ao seu invento.
Eu não precisava dizer mais nada. Ao tirar a granada dos bolsos, pensei na reportagem da biblioteca. Estaria eu cumprindo meu destino? De uma coisa eu tive certeza: êxito. Eu não fracassei. Grande êxito.
Puxei o pino.

(se faltar algum acento é culpa do computador okok)

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

- crise.

vai, tristeza, vai embora. leva com voce todos os sonhos perdidos, as lembranças insuportaveis e os rancores antigos. leva esse amor que me trai em lagrimas; vai, tristeza, me deixe tentar outra vez. vai embora com a saudade que me impede de repelir o passado e abraçar o futuro. procure outro alguem pra atormentar e tirar as esperanças. eu consigo; eu posso fazer isso, posso ser feliz de novo. eu soh preciso que voce leve com voce tudo que me fez feliz antes, pra que eu possa redescobrir a felicidade em outros olhos. vai tristeza, leva tudo com voce, mas tenta deixar um pedacinho de mim?

(nao liguem, momento depressivo. voltem ao texto anterior e apreciem minha raiva e minha ironia, e ignorem esse paragrafo romantico e choroso okok.)

terça-feira, 9 de setembro de 2008

- nao, eu nao consigo continuar.

o fato de eu estar em um lap top que nao tem acentos contribui. eu tinha aquelas mil ideias na cabeça e uma porra de um lap top e eu pensei, puxa! quer estimulo melhor? nao ter aula amanha e passar a noite toda escrevendo num lap top com uma caneca quente do lado, como nos filmes de escritores que ganham muito dinheiro apenas passando noites com canecas e lap tops (como se escreve a porra do plural de lap top?)(e eu sei que essas coisas soh acontecem em filmes americanos). ai eu chego aqui e percebo que esta merda nao tem nem ç. eu tive que copiar e colar a porra do ç. como voce passa a noite toda copiando e colando çs? e como eu faço a merda do plural do ç?
isso e o fato de que todos os meus textos postaveis estao no outro computador (que nao eh um lap top mas tem acentos) me estimularam a colocar o titulo (jardim II) e... xingar os pais e as maes dos americanos que nao usam a porra do acento. e inventam lap tops! (o plural de novo).
perdi uma noite de escritora americana xingando os americanos e fazendo um texto desses de desabafos em que eu nao consigo nao colocar varios palavroes. eles descrevem e quem le meus textos sabe do meu vicio por descriçoes.
e eu sempre acho esses textos feios.
se nao fosse eu que estivesse escrevendo e sim uma das mirabolantes personagens da minha cabec(com cedilha)a, ela seria uma escritora americana e escreveria "porra, preciso de um camels"; por que escritores americanos sempre fumam cigarros, e escritores americanos depressivos sempre fumam camels. sei la se eh assim que se escreve essa porra, voce entendeu o que eu quis dizer. seria ateh bom ter por aqui um camels e um lap top com acentos. e, Taisinha, nao se esqueça da caneca quente! capuccino ou cafe?

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

- jardim;

Era uma daquelas festas black-tie e Mariana não se dava muito bem com o scarpin apertado. Tomando muito cuidado para não arruinar as cinco horas que passara no cabelereiro, e agindo com uma delicadeza que não possuía, procurou André em meio aos convidados arrogantes de Vanessa. Ele estava lindo vestido a rigor, meio deslocado, entre algumas modelos famosas e um executivo solitário e rabugento. Mariana foi até ele, sentindo-se como uma salva-vidas ao encarar um sobrevivente.
André não se parecia nem um pouco com a mãe. Vanessa tinha o rosto largo, era troncuda e de baixa estatura; enquanto o filho puxara o rosto longo e a altura do pai. A única semelhança era a pele clara e os cabelos negros, lisos e bagunçados no filho, hidratados e infestados de arranjos na mãe. Ela bem que se esforçara para fazer do filho um membro da sociedade alta, fino e elegante; mas André era muito diferente, o que fazia Mariana se orgulhar. Ele era a única pessoa daquele lado da família que ela realmente gostava, e que se interessava por coisas muito mais úteis e inteligentes do que manter as aparências.
Ele pareceu feliz ao vê-la; deu um daqueles sorrisos rápidos e espontâneos que ela adorava. Sem dizer nada, ele pegou sua mão e a levou para o jardim. Mariana pensou no tanto que sua mãe se esforçava para arrumá-la cada vez que Vanessa dava uma festa, e no pouco que realmente via das celebrações. A maior parte da noite era reservada a André, o jardim e as estrelas.
O scarpin foi rapidamente abandonado apenas alguns centímetros antes da grama. André a conduziu por entre as árvores posicionadas por um dos melhores paisagistas da região, até um ponto tão desprezado pelos convidados que eles jamais seriam percebidos. Sentaram-se na grama, tão à vontade quanto não estiveram apenas alguns minutos antes; um de frente para o outro. André tirou do bolso um pacote de balas de goma, e Mariana sorriu. O de sempre.
Primos distantes, só se conheceram alguns anos antes daquele dia. Foi o suficiente.
Naquela noite, a mãe de Mariana reparou nos dedos melados de açúcar e nos fiapos de grama do vestido caríssimo da filha; e o pai reparou no olhar de quem começa a se apaixonar. E, ao acordar, Mariana tinha uma flor debaixo do travesseiro.

(eu acho que continua.)

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

- opostos;

Hoje eu tive uma noite de insônia tão forte que nem fechar o olho eu consegui. E, quando uma coisa dessas acontece, a única coisa que dá pra fazer é pensar. E eu pensei em tudo.
Pensei em como você conseguiu fazer parte de tantos opostos na minha vida. Em como você chegou e eu me apaixonei por cada gesto seu, e você me fez a garota mais feliz do mundo. Pensei no amor que você plantou em mim e que demorou tão pouco pra nascer e guiar cada passo meu. Na euforia que eu sentia ao pensar na sua existência, ao ouvir a sua voz, sentir os teus carinhos. Pensei em todos os textos em que eu tentava descrever o que sentia. No seu sorriso, gravado em minha memória. No melhor tempo da minha vida, em que você estava ao meu lado, em que o seu amor instantâneo não tinha ido embora tão rápido quanto tinha chegado. Você me fazia um bem enorme, você era todos os motivos que faziam meu rosto se abrir em um sorriso o tempo todo. E hoje eu tento escrever um texto que descreva como é arrasadora a dor que me acompanha como uma amiga moribunda; como é cruel a saudade quando ela está presente o tempo todo. Você conseguiu o oposto de tudo que construiu em mim. Conseguiu trazer tanto amor e tanta dor pra minha vida.. Me fez uma pessoa melhor e um lixo em dois tempos. Eu tento descrever tudo isso. Mas eu nunca consigo.
E agora não há mais nada a fazer, além de deixar esse amor adormecer pra ver se a dor vai junto; como aconteceu da outra vez. Como eu pensei que nunca mais aconteceria. Esquecer está sempre fora de questão; não há como reviver depois de morrer de amor. E a saída é sempre a mesma; não se importar com nada, pra que a saudade vá junto. Chegar ao fundo do poço e não olhar pra cima; fingir um sorriso ao invés de chorar de dor.
E eu pensei em tudo isso hoje, e senti que precisava haver outro jeito; mas ele consumiria todas as minhas poucas forças, que eu já uso pra viver sem você. Então, pra não deixar passar em branco, eu decidi escrever um texto brega como esse, porque às vezes eles são diretos o bastante pra descrever. E eu sinto uma necessidade enorme de descrever tudo.

terça-feira, 26 de agosto de 2008

- a última lágrima;

A avenida infestada de carros à sua volta não era nada; apenas algumas poucas luzes perdidas. Os sons se misturavam com as frases que cismava de repetir na própria cabeça, para si mesma; era preciso se convencer. O frio cinza-gelo dos vidros dos carros piorava cada vez mais; misturado com o ar gélido que ventava contra seu rosto, inchando seus cabelos; ela não se importava. Andava no meio da rua movimentada, não sem medo, mas sem a menor percepção das coisas; sentia o freio de carros próximos, mas não diminuía o passo, sequer virava os olhos; não que tivesse fé. Apenas indiferença. A raiva subia-lhe aos olhos, despencava-lhe o estômago; seguia, sem parar pra olhar pros lados, atravessando em faróis abertos; os braços nus arrepiados, as mãos dormentes; mas ela não sentia frio. Ela não via nada, não queria nada; apenas sentia o rastro de raiva que deixava em cada passo marcado no chão. Sua mente a elevava aos céus; naquele rosto no banco dos réus, uma expressão de sonho no rosto, era tudo que ela precisava; nada importava mais. Era a culpa, de alguém que tinha o seu amor; que pesava mais que chumbo em suas costas.. uma culpa que não era sua.. uma culpa que devia lhe causar repulsa, e não raiva de si mesma por não deixar de amar. Seus olhos se avermelharam, era a hora; sempre chegava a hora. Uma lágrima caiu. E aos céus mal iluminados ela prometeu que seria a última.
Sentiu a avenida brilhar aos seus pés, reverberando a emoção que sentia; não era felicidade, talvez apenas a energia que provinha da promessa que acabara de fazer... talvez a expressão exata da vontade que sentia, de afundar naquele infinito do céu e espalhar lá de cima o amor que transbordava em suas veias em forma de luz.
Quem sabe assim ele não acabasse de vez? Quem sabe ele não se esvaísse em suas promessas? Ela sabia que sim, ele iria; deixaria suas cicatrizes fundas, mas iria... e ela sorriria e cantaria pra quem quisesse ouvir, aquela música que tanto sonhou em realizar; 'ali onde eu chorei, qualquer um chorava; dar a volta por cima que eu dei, quero ver quem dava'.
Quem sabe assim, ele já não acabou de vez?

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

- um remember;

sinto seu cheiro em todos os cheiros, só o seu abraço em todos os sonhos...
supero meus medos e espero seus erros, de braços abertos.
o mal vira bem, noite vira dia; não há mais angústia, só há teu sabor;
me espere entre flores ou por outros caminhos,
não me mate de amor nem me deixe sozinha;
só seja eterno, e imperdoável; inexista pra sempre, de um jeito sutil;
e marque minha história, com a nossa história, intensa, simplória, completa...
me faça sorrir, arder em sorrisos;
e por nada no mundo me deixe perder seu calor.
que não seja rápido e substituível;
que seja presente, e inesquecível.
que seja perfeito, como sempre foi.

(é aniversário dele hoje. e eu lembrei.)

domingo, 17 de agosto de 2008

- como um filme;

não me prometa nada que não possa cumprir,
não acaricie meu rosto nem me diga que irá voltar,
só me deixe chorar esta noite.

você fala comigo mas eu não ouço a sua voz, é simples;
você não é mais meu como deveria, não como prometeu;
eu te deixo ir, te ajudo a levantar se for preciso,
enxugo as suas lágrimas e te mostro o caminho,
não peço nada em troca, eu só preciso
que voce me deixe chorar, esta noite,
só esta noite.

instável; eu procuro certezas e acho as erradas,
procuro decisões e nunca sei as certas,
eu decido a sua importância mil vezes,
mas eu sei, eu sempre soube,
que ia chorar esta noite...

tudo passa como um filme,
no repeat. eu viveria tudo outra vez,
e outra vez, mais uma; no repeat.
eu moveria mundos e fundos pra ter o seu sorriso a milímetros do meu.
pra ouvir de novo a sua voz dizendo que me ama,
de verdade dessa vez; pra sempre dessa vez;
mas não me conforte, não me abrace,
só me deixe chorar, esta noite,
me deixe chorar.

não me deixe acreditar que você vai voltar,
não me deixe acreditar que tem volta,
me deixe chorar de dor, não me deixe iludir;
me deixe chorar, esta noite...

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

- círculo vicioso;

E lá estava eu, numa bela tarde de verão, agachada entre um banco decrépito e uma parede suja de umidade, me esforçando pra não encostar em nada. Tudo pra ceder a um vício.
O cigarro queimava lentamente, e ao mesmo tempo que eu desejava que ele acabasse logo pra que eu saísse dali, eu torcia pra que não acabasse tão cedo o último cigarro do que eu tinha prometido ser o último maço. E, pra que ninguém soubesse da minha inconveniente recaída, eu tinha ido no canto mais porco e desabitado do estacionamento do shopping.
Ofendi mentalmente até a décima geração daquele que inventou as baratas. Lá estava uma delas, morta, a poucos centímetros de mim; e o susto que tomei ao percebê-la quase me derrubou da minha posição higiênica. E me perguntei o que diabos eu estava fazendo ali.
Apaguei o cigarro pela metade, reunindo todas as minhas forças restantes, me levantei e saí dali com a maior dignidade possível. Me senti covarde. Cada mísera fase ruim da minha vida rendia no mínimo, três recaídas e quatro promessas de não-recaídas. E eu me reduzia às baratas e à imundície pra acender um cigarro que me faria esquecer que talvez tudo não seja tão fácil quanto eu achava que seria.
E tudo isso só por alguns minutos.
Despreze a si mesmo, e veja como é. Eu sabia que tentaria resgatar a merda que tinha feito da minha vida, o mais corajosamente possível que meu caráter covarde aguentaria. Sabia também que era só algo de extrema importância dar errado de novo que eu desceria calmamente do meu pedestal de abstinência e acenderia um cigarro. E teria tanta pena de mim que choraria ao ouvir a brasa estalar em meus ouvidos, e gastaria mais alguns reais em um maço jogado fora.
Meu salto quebrou com o esforço de sair dali sem encostar em nada. A chuva começou a cair. Deixei que molhasse meus cabelos e tirei o que restava da minha sandália favorita. Fiz o máximo possível pra me sentir limpa, mas sorri ao passar pelo espelho lateral na porta do shopping. Eu estava um lixo, como o lugar de que tinha acabado de sair. E não havia nada nem ninguém que me mudaria, a não ser eu mesma.
Quem sabe uma última promessa não pudesse dar certo?

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

- numb.

Eu olho pela janela, cheia de medo, e não adianta; você ainda está ali.
Até quando?

sábado, 9 de agosto de 2008

- tempo;

'E ao olhar pra trás ela viu que nada era como antes. Tentou rir-se de seus acessos nostálgicos repentinos, mas o gosto amargo amarelou a tentativa. Percebeu que tudo em que apostava a eternidade desmanchava-se facilmente com o tempo, ou um obstáculo qualquer; a distância, uma discussão, uma mágoa.. O passado bateu de frente, e, com medo, ela olhou para o futuro e amedrontou-se mais ainda.
Quantas mudanças a esperavam, quantas travessuras do destino ainda teria de enfrentar? O que seria dela alguns míseros meses depois daquele dia? Quantas pessoas ainda iria ter? O vulnerável do ser humano pareceu mais claro diante dessas perguntas; tudo podia ser destruído, com um mero acidente; assim como uma brasa dá origem a um incêndio que toma tudo sem pedir licença. O reconhecer do presente tem um valor inexplicável às vezes, conforta. Agora eu estou bem, agora nada de mal acontece, agora estou longe de tudo.
E o agora diz, que esperanças existem; quem sabe daqui a uns anos ela poderia se acostumar? Quem sabe pudesse encarar o passado de frente, sem refugiar-se em destinos infundados? Quem sabe seria fácil dizer que viveu o bastante, mesmo sem nunca ter sido o bastante?Covarde como era, optou pela fuga mais fácil: decidiu não pensar mais nisso; e afastou os pensamentos verdadeiros, trocou-os por alguns mais simples, menos dolorosos, menos dignos. E achou que se sentia em paz.
Era o suficiente.'

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

- milhares de intenções;

E aí, em algumas poucas palavras incontidas, ele revirou seu estômago de ponta cabeça e provocou uma série de lembranças indesejáveis. Não que a intenção fosse essa; na verdade, a conversa foi simples, carregada de uma implicidade mútua, dolorida, pacífica. A cada comentário casual ela sorria e entendia; e ela entendia com tanta certeza que tudo não teria sentido se fosse de outro jeito. Mas então, por que ela sorria? E eles foram conversando assim, subliminarmente, na ânsia de não dizer nada de modo nem ligeiramente direto; mandando excessos de sorrisos nervosos e perguntando coisas tão sem significado que na verdade eram uma tentativa considerável de continuar o assunto. Ela lembrou-o sem querer de um comentário do passado, de tempos melhores; ele perguntou como as coisas iam indo, na verdade querendo perguntar se ela já parou de chorar por ele pra ele poder parar de sentir remorsos. E quando concluiu que sim, ganhou um ar de "tudo bem agora" que não correspondia às lágrimas sozinhas que ela derramava em silêncio.
Então, para cumprir seu dever de ex-namorado companheiro e amigo, ele acabou com a resistência de semanas que ela havia construído; rompeu cada barreira, resgatou cada sonho, recriou cada saudade e lembrança adormecida. E ela chorou de vontade de vê-lo e sentir seu perfume único de amor maldito outra vez.
Não é justo.
Ao dar a meia-noite ele referiu-se à outra; pra todos verem que o passado ficou pra trás. E ela sentiu o passado no presente, o presente insuportável, e o futuro distante de seu caminho; como se algo a puxasse para trás e a impedisse de viver mais uma vez; como se ele tivesse esse direito.
Ah, as lágrimas. Sempre gostou delas, do gosto de sal, o sabor do alívio; mas hoje, ao afogar-se no que restava delas, sentiu o amargo gosto do fel.

(um pedido de perdão pela depressão do post, mas é verídico demais pra que eu consiga escondê-lo.)

domingo, 3 de agosto de 2008

- mais do mesmo;

Era só o vazio. Qualquer coisa que ousasse florescer ali era rapidamente distorcida pelo vácuo. É, talvez a indiferença fosse mesmo a crueldade do mundo.. A falta de ar inspirava perdas, o que quer que fosse, se perdia com o tempo; não durava o suficiente pra garantir sua devida importância.. e talvez fosse assim até hoje, se não fosse por ele.
Na verdade, ele sempre esteve ali. Quando se perde a capacidade de sentir, se perde também a capacidade de acreditar no sentimento de qualquer um que queira se aproximar. Todas as intenções parecem as piores, todos os olhares trazem consigo uma insatisfação. Ele sempre esteve ali.
O carinho faz milagres, há de se concluir.
Apenas um protótipo dele, somado ao prazer do segredo; foi suficiente. Por mais que fosse reprimido, não desistiu de aquecer o frio, oxigenar o vácuo; tudo aquilo que impedia as flores de perfumarem o espaço. Ele foi mágico, foi simplório e indispensável; um carinho de resgate.
E, graças à origem, toda vez que ela decidia descampar o lugar, respirava fundo e o cheiro dele lhe vinha ao corpo. E tudo começava outra vez.'

sábado, 2 de agosto de 2008

fazendo honra ao título..

Ela passa o dia de pijama, faz comidas não-saudáveis, não sai do computador e só escuta black music; ela assiste filmes infantis, chora com propaganda de detergente, escreve textos sem sentido e quase joga o celular pela janela; ela procura um motivo decente, desarruma o quarto, anda pelos mesmos lugares o tempo todo e pede pra não sonhar; ela não põe brinco, lê livros difíceis, esquece de estudar e odeia o branco do céu; ela se desespera ao abrir os olhos, respira fundo três vezes, se lembra que era só um sonho e deseja um pesadelo da próxima vez; ela chora e ri da sua idiotice, lava o rosto, passa um perfume e se promete que tudo isso vai passar; ela consegue ser feliz e triste ao mesmo tempo, esquece de acreditar em Deus, reza mesmo não acreditando e dorme pra não ter que pensar; ela assiste a si mesma o tempo todo, tem raiva de tudo, canta ao lado do pai e desiste de deixar pra lá; ela tenta se convencer o tempo todo, um dia ela vai mudar, um dia tudo vai mudar.