sábado, 20 de setembro de 2008

- casa grande;

Eu desci as escadas empoeiradas em direção à sala mal iluminada, com cuidado para não perder nenhum detalhe. As janelas antigas emperradas ainda tinham o mesmo vidro que eu quebrara quase trinta anos antes, quando brincava no quintal, e as paredes ainda conservavam um esboço dos meus desenhos antigos. O lustre de ferro estava tão enferrujado que tive medo que caísse sobre mim. Olhei em volta.
Nos tantos anos que passei longe daquela rua, daquela casa, eu me sentia um nostálgico depressivo toda vez que pensava no passado. Nenhuma das casas enormes cheias de modernidades em que morei me traziam a satisfação da infância; eu lembrava das construções brancas com telhados vermelhos, das reuniões na igreja aos domingos, das brincadeiras incontáveis que inventei; e nada conseguia atingir o encanto daquela rua. E fora em busca dessa sensação que eu atravessara tantos quilômetros e chegara ali.
Mas naquele momento eu senti que havia algo errado. Eu buscara por tanto tempo nas lembranças o conforto que havia perdido ao sair dali, e, ao estar de volta, não sentia o mesmo. Me assustei ao me deparar com um espelho: eu vi a repugnância em meus próprios olhos. Era como se não fosse a mesma rua, mas só mais uma vila qualquer da periferia de uma cidade qualquer. Alguma coisa estava faltando; alguma coisa que deixasse aquele lugar tão bonito quanto fora antes.
Saí da casa. Me surpreendi ao lembrar que, já na minha época, as paredes tinham a tinta descascada e a poeira já atingira níveis incontroláveis. Estava tudo igual, e eu não conseguia imaginar o que poderia estar ausente. Decepcionado, estava prestes a voltar ao carro quando o vi.
O tempo o envelhecera, mas ainda tinha as mesmas feições de criança. O menino da casa ao lado. Ele sorria. Senti o passado me chamando, perigoso e tentador. Abri mão de toda a minha barreira contra sentimentos fortes, e me permiti lembrar das noites brincando na rua, do cheiro de café quente, das corridas até a pracinha, do amor que eu sentia por cada morador daquela rua que hoje já não abrigava mais ninguém. O conforto de finalmente sentir de novo me abraçou. E percebi que aquele amor nunca deixou de existir, não pelo lugar, mas por tudo que vivi ali, todas as amizades que contruí, tudo que aprendi com meus amigos; percebi que qualquer lugar poderia ser o meu lar se nós estivéssemos todos juntos.
Olhei em volta, ofegante, e, finalmente, em casa.
A rua estava linda.

(esse texto eu escrevi pro concurso de redacao do diaro do grande abc. tema: amizade na rua. lol
e o outro (arquivo 11) eu queria continuar, mas tenho serios problemas de criatividade sob pressao.)

Um comentário:

  1. acho que a cada dia você escreve melhor...adoro sua forma de narrar mesmo!!!! sou seu fã
    beijão e obrigado pela visita!
    to te linkando lá...

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